quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Preleção



O melhor

A bola rolou. Nas ruas estreitas da baixada santista. Ele, ainda era só um garoto. As peladas, canetas, rolinhos e a fábrica de chapéus, tocas ou mexicanos, já eram parte do repertório. Às vezes, os dribles valiam mais que os gols. E os gols eram comemorados com a alma, alegria, dança e, provocações, porque não. 

Valia tudo, sem ninguém ganhar nada. Nada de valor material, mas se ganhava muito de valores que realmente valem; o prestígio, respeito, o sorriso da menina da rua, ser o primeiro escolhido quando se tira o time. E isso, realmente vale mais que ser o melhor do mundo da FIFA. Ele era o melhor da rua e continua sendo.

Não importa querida FIFA, que diga ao contrário, nem que os torcedores brasileiros também elejam outro. A opinião que vale é dos torcedores da rua, aqueles que correm e mantém vivo o futebol verdadeiro, com os pés nos asfaltos, faça sol de 40° graus ou chuva para ficar escorregadio.  A medalha não é de ouro, nem de prata e nem de bronze. É de ‘honra ao mérito’, e dessa, ele têm milhares, foda-se a das olimpíadas.

E aqueles que dizem entender do futebol, dizem que o cabeludo que joga na Catalunha é melhor que ele. Oras, são uns prisioneiros das imagens televisiva, dos melhores momentos, pois duvido que aquele Hermano faça em 90 minutos o quê nosso anjo do moicano faz em 9 segundos. E outros, ainda mais ousados dizem que o português, jogador de Madrid está à frente da joia tupiniquim. Ora, será possível tamanha barbárie? Aquele portuga é no máximo bem treinado e corre bem. Já nós temos um gênio, que faz o inexistente, ele inventa.

O garoto faz as novidades do futebol, e ainda, tem aqueles que dizem organizar as peladas profissionais, se bem que, às vezes, raramente, duas vezes por semana temos jogos, juízes, estádios piores que a várzea. E onde já se viu, não poder comemorar gol com alma, alegria, dança e, provocações, não. Porque se não irrita o adversário. Logo, logo vão acabar com a derrota, pois tem aqueles que não sabem perder. 

Eis que imploro ao craque da baixada santista: Assim que o futebol ficar chato, vem morar na minha rua, se eu ganhar no par ou impar, escolho você!



terça-feira, 30 de outubro de 2012

Divã do Sexo



À noite chuvosa em Desterro de Entre Rios não impede Nina Pardal de ir trabalhar. Ao adentrar no bordel a energia do ambiente era completamente diferente. A Casa da Alegria estava lotada, homens e mais homens a procura de saciar os prazeres sexuais.

Dona Esmeralda Furacão tenta controlar a louca concorrência por Nina. Se a mulata não tivesse prometido se entregar a seis clientes por noite, naquele dia, deitaria com pelo menos três dúzias de homens. Sim ela era a sensação e quem causava as melhores sensações.

Por volta das 3 da madrugada, Nina já havia enlouquecido cinco rapazes, mas um no balcão lhe chama a atenção. Moreno, alto, magro, olhos cor de mel, vestido casualmente com um traje esporte fino, um chapéu branco e um lábio carnudo. Estranhamente nenhuma menina chegará perto dele. Ela anda em direção ao moreno, a cada passo suas curvas parecem soltar um perfume arrebatador, pois todos os narizes viram a ela.

Uma das meninas da casa a segura pelo braço e murmura:

- Nina, não! Esse ai é enrustido gosta de dedo atrás! 

- Há há há há há! Eu adoro dedar! Finaliza a morena de olho no moreno e na sua promessa terapêutica.

O rapaz de rosto lindo vira cuidadosamente ao ser tocado no abdômen, o olhar de ambos paralisa por alguns segundos, mais que uma química ou vontade carnal. Era sim, um encontro do destino. E sem perder tempo a musa se oferece:

- O Moreno que eu ainda não sei o nome, vai me deixar cuidar dele? Acariciando as coxas e com a língua no canto da boca. 

O rapaz não titubeia e emenda:

- Minha graça é Nelson, não tão gracioso como Nina Pardal, a famosa. Cuidar de mim! Claro, mas como eu quiser?

- Com todos os dedinhos, meu lindo! Arremata a mulata com uma piscada de arrepiar.

Nina propositalmente pega a chave do quarto 24, para tira do armário a moça que existia em Nelson, e não precisaria de muito tempo.

A mulata joga o rapaz na cama que sem vergonha alguma se vira de costa e aguarda o dedo de Nina, ela não pensa duas vezes e sem cuidado nenhum lhe aplica o dedo.

- É disso que você gosta! É uma menina!

O rapaz se espanta e gaguejando tenta remediar:

- Não, não, é que, sa... é....! Eu gosto disso só com mulher!

- Rapaz, pare de mentir para você! Se assuma, vá ser feliz, você gosta da mesma fruta que eu. E se bobear, até mais do que eu. Há há há há há há!

E a gargalhada entra nos ouvidos do rapaz como uma fecha, machuca, mas liberta! Ele chega ao orgasmo e aos gritos:

- Liberdade, liberdade, liberdade! Eu vou me libertar!

Levanta e já sai ao rebolado do quarto. A Nina só resta lavar as mãos e esperar até a próxima terapia.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Acasos



 Bem Mal


O sol estala na grande metrópole brasileira. Os paulistanos sofrem com a sensação térmica de 40° graus. Muitos com pés diretamente no asfalto vão sobrevivendo, porque é quase impossível viver.

E muitos vão morrendo, pois parece que assim tem que ser. Naldinho, 13 anos, morador do Morro do Piolho, Zona norte da cidade de São Paulo.  O calor infernal, não deixa que ele vá dormir cedo, nos dois cômodos da casa, apenas uma janela, a rua soa como um convite tentador. O relógio velho do camelô no pulso do garoto marca 23 horas e 11 minutos, a madrugada se aproxima, mas a escuridão já domina todo o céu do subúrbio. E logo dominaria as ruas.
 
Seis garotos mais velhos. Zé, Dudu, Marquinho, Ferrugem, Doriva e Magal conversam sobre carros e motos, no paredão de frente da casa de Naldinho. Obra do destino, o papo termina com o barulho de duas motos CB 300, e quatro indivíduos encapuzados, um já logo aborda:
 
- Vai caralho, encosta, encosta! Vira para a parede, mão na cabeça e perna aberta... Vai filha da puta! Em seguida o tiro para o alto anunciava o fim do papo e da vida dos meninos.

Um ainda tenta dialogar com os exterminadores:

- Senhor, senhor, somos trabalhadores! 

Mas o tapa na cabeça e o soco no estomago acabam com o diálogo. Em segundos, os quatros indivíduos exterminam os seis rapazes. Todos com dois tiros na parte de trás da cabeça a queima-roupa.

Naldinho se abala, não muito, isso já é algo que esta na rotina de quem mora na favela, tem que estar esperto, para não ser o próximo. Após a longa demora, chega a policia ao local, ambulância nem aparece, os dois que ainda respiravam, deixam de respirar com as duas voltas a 10 km por hora jogados no banco de trás da viatura.

- Naldinho, entra já são 3 da manhã!

Exclama a mãe do menino com naturalidade com o fato ocorrido. No dia seguinte ao voltar a pé da escola, vê o corpo de um Policial Militar de folga estendido no chão. Enquanto fazia exercícios físicos foi alvejado por dois meliantes que pararam uma moto, estavam fortemente armados e não deram chance para o rapaz de 25 anos, que deixa a filha de apenas três só com a mãe.

Um amigo de Naldinho exclama:

- É policial, tem que morrer mesmo! Com um olhar de ódio e um tom de voz que carregado de rancor leva um passado de violência em cada letra.

Naldinho ameniza:

- Ih Jão, o cara tem família também, não é assim!

- Mas e ontem Naldinho, os moleques tiveram chance? Eles não querem nem saber...

- É verdade! Nem eram envolvidos em nada!

- Então, podia ser eu ou você!

-É policia tem que morrer! Finaliza Naldinho já corrompido e submetido a fortalecer uma ideologia cada vez mais forte.

Nesse pequeno diálogo cheio de exclamações, um relato surreal de uma realidade cada vez mais triste, das ruas cinzentas da capital paulista que transbordam a insegurança, da luta da policia contra o crime organizado, da luta paralela do inocentes contra o crime organizado, que roubam e impõe o medo, da luta do inocente para não morrer nas mãos de exterminadores vingativos, da luta do inocente por paz. Daqueles que querem viver e cansaram de apenas sobreviver.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Papo de Quinta



 Jão, vai votar!


A manhã ainda escura pelo horário de verão, o vento forte que cisma fazer barulho pelas brechas nas janelas da sacada, que ora e outra dão um tom melancólico ao começo do dia são instantaneamente esquecidas pelo despertar do rádio:
- ♫♪♪♫
“Chega de tentar dissimular e disfarçar e esconder
O que não dá mais pra ocultar e eu não posso mais calar
Já que o brilho desse olhar foi traidor
E entregou o que você tentou conter
O que você não quis desabafar e me cortou
Chega de temer, chorar, sofrer, sorrir, se dar
E se perder e se achar e tudo aquilo que é viver
Eu quero mais é me abrir e que essa vida entre assim
Como se fosse o sol desvirginando a madrugada
Quero sentir a dor desta manhã (...)”

O corpo resiste por algum tempo na cama, mas logo a obrigação de levantar e escolher quem será o pastor do rebanho pelos próximos quatro anos se faz necessário! E que necessidade...
            Gonzaguinha teve tempo de terminar a cantiga:

''Nascendo, rompendo, rasgando, tomando, meu corpo e então eu
Chorando, sofrendo, gostando, adorando, gritando
Feito louca, alucinada e criança
Sentindo o meu amor se derramando
Não dá mais pra segurar, explode coração... "♫♪♫♪

            E desliguei o rádio com um mau humor absurdo. Lavei o rosto, mais sonolento que acordado, escovei os dentes rápido como quem faz obrigado, e fiz. Procurei o titulo de eleitor na imensa gaveta, tão pequena que abismava pela grandeza da bagunça que suportava. Enfim, achei e segui rumo à obrigatoriedade democrática, sim, contraditório!
            Ao passar e escorregar duas ou mais vezes no chão, ou melhor, no tapete de santinhos dos candidatos. Bom, se bem pode ser meu chinelo que está velho? Bom, também pode ser que mundo anda escorregadio? Então, consegui ficar em pé e de orelhas atentas para ouvir um velho barbudo, com a voz rouca e dentes amarelos, balbuciar:
            - Eu, vivi a ditadura, não podia escolher em quem seria o prefeito... E blá, blá, blá, blá!
            Deveria ter lutado pelo direito de escolher não ser governado por ninguém, tiozão! E o outro, que com uma empresa de porte médio, economicamente com algumas regalias, queria e proferia a continuidade desses pássaros, que querem os voos de poucos e o restante rastejarem:
            - Gente, está claro que esses de esquerda querem que trabalhemos para os que não trabalham. Querem dividir. Onde já se viu? Querem igualdade... E blá, blá, blá...
            É patrão... Só você quer comer o pão! Poder para poucos e poucos no poder. E muitos sem nada por já não terem nada. E a vida segue, respiro e entro na seção 69 e etc. Voto. Livro-me da obrigação... 
           Quero saber é do futebol, galera está esperando, churrasco e cerveja gelada! Escolher quem vai sair jogando é bem mais importante!
E assim, vai que não vai!
           É para fingir que nada é sério? Que nada importa? Que a impunidade continuará? Que ninguém presta? Que não a esperança? Avisa-me! Mas avisa mesmo apara eu jogar e beber de primeiro de janeiro ao réveillon! 
    Cansou Jão!

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Ganhei uma foto

Eu ganhei uma foto e o pedido de escrever um poema. Mas ao pensar nela, os pensamentos tomam conta de mim, escorrem e transbordam da mente pelas veias, correm pelo corpo inteiro, chegam ao coração e fazem todo caminho inverso, até voltarem de onde vieram. É assim durante todos os segundos dos dias.

Achei que apenas em um poema seria impossível expressar a sensação de ter ganhado a foto. Sim, ganhar uma foto é algo para sempre. É o registro da imagem de algo ou alguém com todos os sentimentos e pensamentos que haviam naquele momento, enquadrado e eternizado por um “Click”.

Foi como ter recebido ela para sempre naquele momento. E foi. Por mais que os caminhos da vida tomem traços estranhos, aquela foto será sempre minha. Para mim. E isso a vida não será capaz de levar.

Nem mesmo as lembranças dos momentos vividos por mais ou menos tempo, que sejam momentos onde o amor se dá por atos de carne e osso, carinho na extrema raiz da palavra.

O poema eu fiz, mas queria e quero fazer muito mais. Não apenas eternizar a foto, talvez eternizar o sentimento que toma conta de mim, no dia a dia, em atos. Sim, demonstrar que além das fotos o amor pode ser guardado, visto e vivido todos os dias.

Até sempre

Eu acordei à noite, como sempre faço,
Mas, dessa vez, eu não quis voltar a dormir.
Fiquei te olhando, minha mão tocava a pele suave do seu rosto,
E, ali, eu poderia ficar até sempre.

Esses dias eu estava triste, sem saber para onde ir,
sem saber o que fazer e foi então, que meu corpo perdido
encontrou seu abraço e tudo fez sentido.
Eu viveria naquele abraço até o sempre.

Como eu queria viver e ouvir cada gargalhada sua,
cada beijo ou aquele “eu te amo”,
tão tímido e baixo que apenas meu coração pode escutar.
Mas é quem precisa sentir isso até sempre.

Quanto tempo dura “até sempre”? Espero que para sempre.
Como espero sempre te encontrar, como espero te abraçar,
Como espero acordar sempre e ver você.
Como guardarei essa foto e você  para sempre, no coração!