segunda-feira, 10 de junho de 2013

Rabugento e o Jornal de amanhã

Seu Rabugento, um senhor de bigode completo, olhos fundos, daqueles que as olheiras não saem e o qual você aposta que o sono não vem. Mais o menos assim, dormi pouco, mas come muito. Daí vem à barriga que dá gosto. Ainda mais, no 1,68 cm, do velhote sabichão. A boina com o brasão da lusa demonstra as raízes. A camisa social com o colete, a calça social com a bota de camurça, o lenço no bolso e olhar furioso. De todas as características e detalhes  a rabugentisse do aposentado é de encher alguns olhos e arranca lágrimas de outros.

A cada dois passos pelas ruas de Santana uma erguida nas calças. A cada esquina atingida, uma saudação e uma resposta atravessada:

- Bom dia “Seu Rabugento”. Diz o Manoel do açougue.

- Bom d... Quase um surro responde o velhote.

- Já tá acordado? Há essas horas.

- Não Manoel. Eu sou sonambulo, ora! Emendou com delicadeza.

E assim, como um cachorro vira-lata, em cada rua uma surpresa, uma farpa, um caso com a rabugice. Só que aqui a briga não é por comida é pela tolerância que não existe.
Seu Rabugento adentra a banca de jornal com uma enorme saudade de ler aquele monte de letras em tinta. Ricardo o jornaleiro todo atencioso, aborda o aposentado.

- Bom dia, Seu Rabugento, vai levar umas cruzadinhas? Ou um caça-palavras hoje?

- Quero um jornal.

- De quando?

- Ora essa, filho de uma... De hoje, ora.

- Calma, Seu Rabugento. Os jornais acabarão hoje, tem gente comprando o de ontem para guardar.

- Como assim, gajo?

- Acabando...

-Acabando, igual sua mãe acabou ao parir esse cabeção. Dá logo o de hoje mesmo.

O Rabugento paga pelo jornal e o jornaleiro faz sinal com as mãos de escorraço, para o velhote ir logo. Ele vai, adentra a praça, mal cumprimenta os amigos aposentado. Abre o jornal e a primeira notícia é:

“Amanhã não haverá mais jornal.
Fim dos jornais impressos: A tecnologia ganha do papel.
O tradicional perde para a modernidade. Tecnólogos desenvolvem E-book com cheiro de tinta, barulho das páginas amaçando ao troca-las e atalho para recortar e guarda reportagem de recordação.”

- Tolice, ora, ora, ora. Até o sinal sumir, o aparelho travar e isso tudo se um dia o pobre puder comprar. Esbraveja o velhote vermelho de tão furioso.

Vai à página de negócio e logo toma um justo: “Governo privatiza o próprio governo”.
- Ora, mas eles só avisaram isso agora? Um dia antes de não ter mais notícia, esses passarinhos.

Na parte de empregos: “Homem procura: uma mulher com dois filhos, para dar entrada à bolsa família”.

-Vagabundo é o que mais tem. Esse povo da estrela não fiscaliza nada. Expressa  ao levantar as mãos para o céu.

No editorial de política: “Eleições ano X: Madame General versus O Vampiro.”

- Quem ficará com a maior fatia do bolo: A falsa esquerda ou o pássaro vendedor. Aí não importa o FMI e o Banco Central no fim agradecem. Ora, ora, ora. Resmunga o velhote.

Ultima página do jornal: “Obrigado por dividir esses longos anos com a gente e tantas verdades e notícias imparciais.”.

O Rabugento caí na gargalhada joga o jornal pra cima e diz:

-Com esse final. Sabia que era piada. Imparcial? Verdade? Aí, aí, aí o que papai Antônio diria, ora, pois. Amanhã cedo compro outro jornal.









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