segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Acasos



São Medo


O fim do dia está sombrio e há dias tem sido assim. Já passa das oito horas da noite e o vento faz a trilha sonora.  Na rua Dr. Araújo de Castro alguma energia maligna parece tornar o clima igual aos filmes de terror.
Na casa número 38 Seu Alberto corre para o telefone e quase tocando um piano disca para a filha Yara:
- Filha onde você está? Com uma voz totalmente desesperada.
- Saindo da faculdade, por quê?
- Estou indo para o metrô te buscar no caminho te explico! Determina o pai com a voz totalmente autoritária.
- Sim senhor. Obedece a menina com respeito abundante.
                Os dois se despedem e parte o pai ao encontro da filha. Mas aquela não era a única casa com anomalias na rua, na casa número 152 Maria chama o primogênito Eduardo para acompanha-la até o ponto de ônibus buscar a filha:
                - Dudu, vamos que Raissa deve estar chegando!
                - Vamos mãe.
                Os dois partem de braços dados. A cada barulho o medo era evidente no rosto dos dois, a cada moto que passava rezavam o último “Pai Nosso”.  Pareciam duas presas que a qualquer momento seriam devorados.  E o caminhar de dois quarteirões parecia a Via Crucis. Enfim, chegam ao ponto de encontro, cinco minutos de espera que pareceram 50 até chegada da esperada:
                - Mãe. Diz sorrindo Raissa.
                - Oh, minha filha, vamos se embora e depressa. Com alegria e preocupação ao mesmo tempo.
                Em casa todos como numa sinfonia transbordam o alivio:
                - Graças a Deus. Em sinal de fé e de segurança no plano divino.
                Na casa dos Montenegro uma discussão calorosa entre Marina e o seu pai tornam ainda mais o cenário da rua Dr. Araújo de Castro tenso:
                - Mas Pai ela é a minha melhor amiga como não vou ao seu aniversário? Você não pode fazer isso comigo! Aos berros e lágrimas.
                - Não vai porque está perigoso lá fora! Bate o martelo e esmaga o coração da filha.
                - Vou perder minha amiga. Ela não vai me perdoar. Lamenta Marina sem força para revidar.
                - Melhor perder a amiga do que a vida. São as últimas palavras do pai antes de sair andando e bater a porta.
                 E em outras ruas, outros bairros, outras situações de medo em noite frias ou quentes estão acontecendo. Esse é o cenário das noites da cidade de São Paulo. O pai que busca a filha no metrô pelo toque de recolher. A mãe que encontra a filha no ponto, pois na noite passada mataram três garotos na rua de cima e o pai que proíbe a filha de ir à festa da melhor amiga, por medo. Medo, medo e mais medo.
                São Paulo, ou melhor, São Medo.

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